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A Complexidade do Mercado de Energia Elétrica no Brasil – Parte 1

  • Foto do escritor: Marcio Funchal
    Marcio Funchal
  • 27 de jul. de 2021
  • 6 min de leitura

Coluna mensal elaborada à pedido da Revista O Papel/ABTCP - Coluna Gestão e Estratégia - Edição de Julho de 2021.


Nos últimos meses o tema da produção de energia elétrica tem tomado lugar em diversos veículos da mídia e norteado discussões sobre oportunidades de investimento em vários setores econômicos.


Um dos assuntos que corroborou para o aumento dessas expectativas é o avanço das negociações no Congresso Nacional sobre a privatização das operações da Eletrobrás, apresentadas pelo Governo Federal. Além deste tema, o cenário positivo da inserção de novas tecnologias e alternativas para geração de energia (incluindo o uso de energia solar, eólica e termelétricas mais eficientes do que no passado) tem servido de impulso para a alavancagem do tema.


Contudo, como de costume, falta neste debate a clareza do que se está de fato discutindo. Aquela famosa frase de palestrante de eventos empresariais, “o Brasil não é para os fracos”, é muito verdadeira para o mercado de energia elétrica no país. Mais do que a boa técnica da engenharia, este mercado exige grande esforço de entendimento legal, uma vez que toda a gestão do sistema está definida mediante um extenso e vasto arcabouço de leis, decretos, instruções normativas e, obviamente, contratos entre partes (governo & empresas, ou empresas & empresas).


E como é tradicional naquilo que eu chamo de “jeito brasileiro de ser e acontecer“, a lógica é muitas vezes deixada de lado para que o regramento seja permanentemente atualizado e reescrito e novamente seja ajustado assim que uma das partes do sistema (gerador de energia, transmissor, distribuidor, Estado, Município e etc) se queixe das regras e sejam implementadas normas adicionais.


Como inúmeros analistas já concluíram, boa parte deste imbróglio regimentar aumenta os custos totais do sistema de geração e distribuição de energia no país e induz mais ineficiência. E quem paga a conta? Claro que é você, eu, nós consumidores.

Neste artigo em especial vamos nos concentrar nos resultados dos Leilões de Energia efetuados no país desde o ano de 2005, quando o Brasil passou a adotar com mais vigor várias ações para diversificar sua matriz energética. Destes leilões, escolhemos apenas os de Geração de Energia para a expansão da potência instalada no país (chamados de Leilões de Energia Nova).


Nestes leilões, o vencedor é a empresa que oferta o valor de geração de energia mais baixo. A partir da data do edital do leilão, a empresa tem então entre 3 e 5 anos para construir sua usina de geração de energia e começar a operar dentro do prazo contratual estabelecido (Leilões do tipo A-3, A-4 e A-5).


O país também realizou até 2019 outros tipos de leilões de geração de energia, tais como leilões específicos de fontes alternativas (ex.: eólica e termelétrica), de compra de energia de reserva (volume de energia que só é demandada em situações de urgência ou emergência) e leilões em sistemas isolados (para regiões do país que estão desconectadas do Sistema Interligado Nacional - SIN, como ocorre em partes do Amazonas, Roraima e Pará). Em 2020 os Leilões de geração de energia foram suspensos em razão da pandemia, mas já foram retomados em 2021.


Portanto, mais uma vez, neste artigo estamos avaliando apenas os contratos de geração de energia efetuados entre 2005 e 2019, para adição de potência instalada ao sistema já existente (SIN). Ao todo, foram avaliados mais de 1.300 contratos de geração de energia para o presente artigo.


A Figura 1 mostra o ritmo de expansão anual de geração de energia elétrica que tem ocorrido no Brasil, com destaque para os anos de 2013 e 2015 com grandes aumentos de potência. Em 2015, especificamente, entrou em operação a usina hidrelétrica de Belo Monte, com seus 11.200 MW de potência instalada (para fins de comparação, Itaipu possui 14.000 MW). Simultaneamente, a mesma Figura mostra que o preço médio anual da energia elétrica contratada das geradoras vem caindo ano a ano, considerando os preços de contrato da época corrigidos a valores atuais. Importante mencionar que o preço aqui mostrado se refere apenas ao valor pago pela ANEEL para a energia gerada em cada usina. O valor pago pelo usuário na residência, comércio ou indústria é bem superior a este, pois ainda considera transmissão da energia, encargos setoriais e impostos. Este e outros aspectos serão abordados em artigos subsequentes.

Já na Figura 2 é possível identificar como se deu a expansão da potência instalada de geração de energia elétrica no país, por tipo de usina. Em complemento da informação, a Figura 3 mostra a composição da potência instalada, por tipo de geração, considerando todo o horizonte temporal destacado. Nesse período, foram adicionados novos 73,5 mil MW ao SIN. Os números comprovam o crescimento da importância da geração de energia elétrica por meio das termelétricas (considerando todos os tipos de combustíveis, sejam eles fósseis ou renováveis), eólicas e, em menor escala, da fonte fotovoltaica.

Um aspecto que passa normalmente despercebido nas manchetes e análises diz respeito à característica tecnológica de cada usina. Quando uma usina geradora de energia elétrica se cadastra junto à ANEEL para comercializar sua energia, é definido um limite técnico que corresponderá à sua, digamos em termos leigos, eficiência técnica em gerar energia ao longo do tempo. Este fator, chamado de Garantia Física, é que define, na prática, qual o volume máximo de energia elétrica que a usina efetivamente poderá comercializar no SIN. Um exemplo para ajudar na compreensão: em uma usina fotovoltaica, só é gerada energia durante a exposição do painel solar ao sol... o que é obvio então que no período noturno não será gerada energia. E ainda é preciso considerar dias de chuva ou nublados, onde também há limitação de geração de energia. Com isso, na prática, os contratos avaliados das usinas fotovoltaicas consideraram uma Garantia Física máxima de 34% da potência instalada. Neste mesmo exemplo, uma usina fotovoltaica com potência instalada de 10MW, por exemplo, terá homologada a garantia física de cerca de 3MW apenas.


A Figura 4 mostra a evolução do valor médio anual de Garantia Física dos contratos de geração de energia no Brasil, segundo o tipo de usina. Na média histórica, as usinas termelétricas são recordistas no tema (68%), pois garantem pela sua sistemática operacional maior controle da estabilidade/ previsibilidade de geração de energia elétrica.


A mesma Figura 4 ainda mostra a evolução do preço médio contrato para cada tipo de geração. Levando em conta apenas os contratos estudados, as usinas fotovoltaicas e as termelétricas representam os maiores preços médios de geração de energia. O menor preço médio atual é da geração eólica, embora represente apenas 6% da potência instalada dos contratos estudados.


Como forma de resumir o tema da Garantia Física contratada e os preços de geração de energia, inseri na Figura 5 uma síntese da garantia física média de cada fonte de combustível empregada nas usinas termelétricas dos cerca de 1.300 contratos estudados no período 2005-2019. A melhor situação se dá nas termelétricas a carvão mineral (garantia física média de 90%). Na posição inversa, a garantia física mais baixa está registrada nas usinas movidas com cana-de-açúcar (apenas 43%, na média).

Já na Figura 6 plotei os preços assinados em cada contrato de geração de energia celebrados nos anos mais recentes (preços da época atualizados para os dias atuais). Percebe-se claramente uma grande amplitude de valores e variações abruptas a cada ano.

Por fim, a última informação deste artigo diz respeito ao investimento necessário para a instalação de cada usina adicionada ao SIN. O valor do investimento previsto foi informado pela empresa no momento da assinatura do contrato de geração de energia com a ANEEL. Assim, corrigindo os valores da época para os dias atuais, tem-se na Figura 7 uma comparação do volume de investimento médio realizado no Brasil nos últimos anos, para cada tipo de geração de energia.


Olhando os números, vê-se que as tradicionais usinas hidrelétricas representam uma espécie de ponto central em termos de custo médio unitário do MW instalado. É claro que, no montante do investimento, as usinas hidrelétricas normalmente representam um volume de capital muito maior do que usinas eólicas ou solares, tudo em razão do porte dos empreendimentos. Além disso, estes números precisam ser usados com cautela, uma vez que se baseiam apenas em informações divulgadas pela empresa, o que pode conter divergência entre o volume real aportado para a instalação da usina (até mesmo por razões estratégicas e de confidencialidade).


Coluna mensal elaborada à pedido da Revista O Papel/ABTCP - Coluna Gestão e Estratégia - Edição de Julho de 2021.


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